quinta-feira, 16 de abril de 2009

O capital cognitivo das novas humanidades

Seminário sobre os textos de José Luis Bréa e Walter Zanini.
Porto Alegre, IA/UFRGS, 14.04.09

No segundo seminário da disciplina Metodologia da Pesquisa em Artes, foram debatidos os textos do espanhol José Luis Bréa[1] e do brasileiro Walter Zanini[2], ambos autores contemporâneos importantes, principalmente no que se refere as suas atuações nos seus países de origem para a implantação de novas frentes de pesquisa e de debate no campo das artes, especificamente para a História, Estética e Estudos Visuais.

Após breve relato de Mª Amélia Bulhões sobre a natureza e importância dos temas do seminário, a dinâmica da discussão se deu a partir de questionamentos provocados pelos próprios alunos entre si. Curiosamente, a maioria das questões (senão todas) levantadas pelo grupo surgiu a partir de dúvidas sobre pontos em que as idéias dos autores não foram absorvidas de forma direta por cada um. Muito se ouviu nas introduções que antecederam as perguntas, frases do tipo ‘não sei, mas o que tu achas que o autor quis dizer com...’, ‘não ficou muito claro para mim...’, ‘não sei se entendi bem, mas...’ e por ai afora. Esse bate e volta de dúvidas criou uma série de questionamentos e respostas construídas a partir de auto-reflexões que a meu ver se mostraram muito ricas na síntese geral do debate. Ao contrário de procurar responder questões previamente formuladas de um texto, o que nos foi proposto era ainda mais desafiador, pois nos convidava a lançar um olhar crítico sobre idéias aparentemente cristalizadas como verdades, e não simplesmente encontrar respostas diretas amparadas pelos trechos sublinhados da fala do Bréa ou do Zanini. Cada um de nós interferiu com suas próprias inquietações sobre os temas em pauta, sem, no entanto fugir do ponto de partida norteador das discussões que eram os dois textos. Terá sido um exercício real da dúvida radical? (hum...)

Bom, sem querer voltar ao Bourdieu (e até fizemos isso durante o debate), as questões mais importantes levantadas pelo grupo giraram em torno das análises sobre estudo das artes nas disciplinas tradicionais da História da Arte e a Estética, e a nova abordagem proposta pela corrente liderada por J.L. Bréa como os Estudos Visuais. Disciplina esta ainda nova e pouco explorada nos meios (acadêmicos ou não) que encontram na visualidade seus temas geradores prioritários.

Resumindo alguns pontos do texto do Bréa no qual mais longamente nos debruçamos, destaco em primeiro lugar a questão da instabilidade atual de uma reconhecida idéia de autonomia das artes frente a outras áreas de conhecimento, uma vez que esta hoje se vê atravessada, ou entrecruzada por outras disciplinas e enfoques que a colocam em cheque frente ao crescimento de novos espaços da vida cotidiana pelos quais um território cada vez mais vasto de práticas de produção de significados culturais vem se construindo.

Analisar como se constrói os significados individuais e coletivos fora do campo da confortável autonomia das artes é tarefa que exige uma flexibilidade capaz de abarcar igualmente procedimentos, materiais, mediações e etc., cada vez mais amplos e diversificados.
‘(...) o transbordamento de limites e fronteiras e a hibridação entre práticas diversas é um fato e parece inevitável que o discurso crítico artístico amplie seus recursos táticos e analíticos – sua maquinaria crítica e interpretativa - para incluir com tanta solução quanto é possível essa extensão – e intersecção – dos modos de fazer das próprias práticas, cada dia mais contaminadas, entre- mescladas e indistinguíveis no colo de outros suportes, gêneros, disciplinas ou mediações, sem incluir outros usos da prática social, política, a construção da vida cotidiana, os processos de agenciamento identitários,...etc.’ (BRÉA, p.11)
O autor cita ainda três modelos de como abordar este quadro, mas com destaque para o que não propõe nenhum corte, substituição ou enjambramento e sim uma metodologia transdisciplinar, num território transitivo que abarque uma constelação de práticas e modos de fazer que possam gerar simbolismos e significados culturais. A estas práticas de ação nos campos de transbordamentos dos Estudos Visuais o autor chama de Novas Humanidades.
Para finalizar com um dos conceitos que me pareceu mais importante dentre os levantados pelo autor, aponto a idéia do capitalismo cognitivo que faz circular idéias como moedas de trocas nas sociedades contemporâneas ao invés de bens materiais. É neste novo conceito de economia geradora de conhecimento como bem imaterial que as sociedades atuais podem estabelecer novas bases de valoração de bens culturais. É ai que o campo da arte se destaca como uma área de atividade humana que já traz na sua gênese a produção de valores intelectuais como ferramenta de sustentação, e onde as potencialidades das práticas de produção do imaginário se multiplicam e se acrescentam a cada dia.

Flavya Mutran

[1] BREA, José L. Estética, História da Arte, Estudios Visuales, in Estúdios Visuales N°3 Madrid, CENDEAC, enero 2006 – (pp.8-26)
[2] ZANINI, Walter. Arte e História da Arte. Estudos Avançados vol8 n°22 São Paulo, set/dec 1994.

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